Nove graus em São Paulo.
Decidida a lutar contra o óbvio e o redundante, proponho-me um jogo: não usar a expressão "que frio!" durante todo o dia, principalmente no trabalho.
Encapoto-me toda e parto em direção ao ponto de ônibus. 70 minutos depois, desço perto do viaduto João Dias e caminho os dez minutos que faltam até o Teatro Alfa. O porteiro me diz "Boa noite!", eu respondo: "Mas que frio, hein!?"
Assim não dá. Mas eu devia desconsiderar, afinal, fui pega desprevenida: vinha andando no vento gelado, ao cair da tarde, só passava isto pela minha cabeça. E se o jogo é meu, posso me dar outra chance. De agora em diante, atenção.
Entro no teatro pelo lobby (é mais quentinho), assino meu ponto e desço em direção ao camarim. Passo por todos os camareiros - "que frio, hein, Aninha?" - e apenas faço mímica de congelamento, enquanto beijo cada um. Mímica pode.
As outras atrizes vão chegando, uma a uma, comentando a temperatura lá fora. Reclamam do vento ao tirar a roupa e resmungam que o figurino poderia ser mais quentinho. Depois dos aquecimentos, subimos ao palco - quase todos comentando o vento encanado que sopra das docas. Resolvo fazer uns polichinelos - de vestido, peruca e chapéu florido, mesmo. "Frio, Aninha?", alguém pergunta. Bato os dentes, em resposta. Bater os dentes vale.
A peça começa e a luz dos refletores esquenta um pouco quem está no palco. Saio da primeira cena e vou para as docas, onde faço minha primeira troca de roupa. Tiro a saia, o casaco e o chapéu. Fico só de meia e collant, enquanto a camareira vai buscar a roupa da segunda cena. O vento encanado - aquele mesmo - bate em cheio nas minhas costas. Aí não vale.
- Puuuuutaqueopariuuuuquefriiiiio!!!
"Calma, Aninha. Frio é psicológico" - diz a Vera, minha camareira, rindo de dentro do seu casaco.
Assim não dá.
sexta-feira, 27 de julho de 2007
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Um comentário:
mas, diz aí: que frio!
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