terça-feira, 29 de maio de 2007
Beverly Hills, Iguatemi.
- Anna? É a Lelê.
Minha amiga Letícia estava na cidade para lançar o filme que tinha feito com o Rodrigo Santoro. Queria saber se eu queria ir à pré-estréia, aquela noite.
- Caramba. Tenho um compromisso.
- Ah, puxa.
- O Rodrigo Santoro vai? - perguntei.
- Vai, claro.
Droga.
...
Eu tinha um compromisso importante, marcado há um tempão, que já havia desmarcado antes por causa da internação. Não podia adiar novamente.
- Meu, não vai dar, mesmo.
- O que você vai fazer agora à tarde, então?
- Nada.
- Eu estou no Ceasar Park, na rua Olimpíadas. Vou ficar aqui a tarde inteira.
- ...
- É muito fora de mão? - ela perguntou.
- É um pouco - admiti, imaginando os 45 min sacudidos no Vila Gilda.
- Então vamos fazer o seguinte: o cabeleireiro vinha aqui no hotel, mas eu posso ir direto no salão, no Shopping Iguatemi, e a gente se encontra lá. Que tal?
Adorei. Primeiro, porque o lugar fica a vinte minutos da minha casa; segundo, porque este shopping é cheio de gente riquérrima e blasé, que finge não dar a mínima para as celebridades (uma vez fomos juntas à Galeria do Rock, no centro de SP, e eu quase morri de tédio, porque eram dois passos e cinco autógrafos - e não era eu que estava autografando!).
Foi o que rolou. Chegamos no shopping, pegamos o elevador e subimos até o 9o. andar, para o Studio W, o salão do Wanderley Nunes.
Uau. Posso afirmar que o visual é calculado para intimidar. É um andar inteiro aberto, sustentado por colunas de ferro esverdeadas em forma de W e meias-paredes de espelho por toda a parte, nunca fechando completamente os ambientes. Uma loucura. Telas de plasma passando clipes dos famosos produzidos pelo Wanderley Nunes (caso alguém desconhecesse o portfolio do rapaz...).
A recepção lembrava qualquer filme passado em Beverly Hills, quando a mocinha vai ganhar o banho de loja. Um longo balcão de aço, cheio de garotas escovadas, altas e magras, de terninho cinza, postadas atrás de seus respectivos computadores. Uau.
- A senhora marcou hora? - a primeira menina sorriu, descaradamente olhando pros meus sapatos (que eram ótimos, by the way).
- Ela está comigo - disse a Lê.
- Ah! - a garota ficou toda embananada - Desculpe, Letícia, não vi... Queiram entrar, deixem a bolsa aqui... Querem um cappuccino? Uma água?
Algumas trufas, chá verde, água e massagens depois, fomos conduzidas ao salão propriamente dito, onde me ofereceram uma manicure de cortesia!!! AHAHAHAHA. Divertido. Inclusive porque a Leticia não tinha marcado hora, também.
Depois de tanto mimo, eu me sentia absolutamente à altura de dar oi pro Rodrigo Santoro, mas tive que seguir o roteiro prévio e correr para o meu compromisso, às seis da tarde. Paciência. Eu já tivera meu "momento Pasárgada". Só posso torcer para a Lê vir mais vezes para cá.
...
À noite encontrei meu marido, em casa, e ele verificava as mensagens na máquina:
- A Letícia te ligou, você viu?
- Vi, saí com ela hoje à tarde - respondi.
- Ah, é? O que que ela queria?
- Convidar a gente pra ir na pré-estréia do filme.
- Aquele como Rodrigo Santoro? - Marcel quis saber.
- É.
- Ele ia estar lá?
- Ia.
- Putz! - suspirou - Por que você não me falou?
Lê e eu, em ângulo bração.
sexta-feira, 25 de maio de 2007
Second Life or No Life at All
Ah, as sombras de platão, bla, bla, bla.
Uns bons vinte anos atrás, o Luiz Fernando Veríssimo publicou uma charge intitulada "O Pós-Modernismo", onde um sujeito filmava um pôr-do-sol deslumbrante e comentava, entusiasmado: "mal posso esperar para assistir isto no vídeo, lá em casa!"
Hoje fui assistir um espetáculo infantil, à tarde, numa sessão fechada para escolas (meu amigo Paulinho está no elenco e conseguiu me pôr para dentro - a peça, aliás, é lindinha!). Mas, enfim, o que me deixou assustada foi a quantidade de crianças que não conseguiam assistir a peça sem filmá-la no celular. Tinha um garoto bem na fila em frente à minha que baixava seus e-mails, jogava, filmava a peça e mostrava o filminho para os colegas, tudo durante o espetáculo.
Afora o desejo quase incontrolável de dar um peteleco no guri, sobreveio um tipo de tristeza, uma pena, porque este guri e todos os piás iguais a ele já não conseguem estar num lugar só e experimentar viver plenamente o momento. Os sentidos foram subjugados por uma ansiedade (burra, burríssima, sem propósito) de dar conta de várias coisas, de não "perder tempo".
Mas o que está acontecendo é isto: a gente está perdendo tempo. Perdemos o presente.
* ilustração: Gregório Gruber
quinta-feira, 24 de maio de 2007
highlights
Animado com a repercussão dos caldinhos da feira da Pompéia, domingo, meu amigo Paulinho concordou em repetir a dose, só que agora em domicílio - no meu, pra ser exata e luxuosa.
O cardápio constituiu-se de dois caldinhos distintos: músculo com mandioquinha e abóbora com alho e curry.A primeira-assistente do Paulinho ficou sendo a Renata, já que eu estava ocupadíssima registrando as atividades. A Rita chegou depois e também me ajudou a beber vinho e distrair os dois que estavam trabalhando.
O chef demonstrou total seriedade e absorção. Nem a esculhambação a que foi submetido comprometeu o excepcional resultado do seu trabalho.
(insira o seu comentário aqui) .................................................................
Neste momento, os responsáveis pela comida deixam a comida terminar de se aprontar sozinha e entregam-se ao ócio edificante do crochê e da conversação. Apenas a fotógrafa trabalhava, incansável.
quarta-feira, 23 de maio de 2007
dalton e outros seres
Peguei o bom Em Busca de Curitiba Perdida e parti, eu, em Busca da Epígrafe Perfeita. Dureza. O Dalton é um aforista, ainda que não fosse a primeira intenção. A síntese que ele persegue produz imagens indestrutíveis, quase pedras:
"Que fim ó Cara você deu à minha cidade
a outra sem casa demais sem carros demais sem gente demais
ó Senhor sem chatos demais
(...)
Curitiba é apenas um assovio com dois dedos na língua"
ou:
"Uivai, pedalinhos do Passeio Público"
Transformar pedra em areia, este é o meu receio.
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E ontem fui ver a Badi Assad no SESC!
Badi está gravidíssima de nove meses, às vezes parava para reclamar que a neném estava chutando. Fez um dos shows mais lindos que já vi ela fazer. E um dos melhores shows que assisti recentemente. Emocionadíssimo, encantador, iluminado, mesmo.
Hoje ainda tem mais um. E ela avisou que é o último que faz, antes da Sofia nascer.
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Anota aí que vai ser bom:
Magos Herrera vem ao Brasil na semana que vem e faz três shows em SP, segunda, quarta e quinta que vem. Depois ela vai tocar em Porto Alegre. E é só. Então vai atrás! www.magosherrera.com
segunda-feira, 21 de maio de 2007
highlights
Paulinho teve a manha de fazer uma sopa de abóbora temperada com alho, cebola e curry. Just that. Comi duas cumbuquinhas cheias e ainda pedi um topoé* pra comer em casa. Uma felicidade.
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Bianca veio aqui em casa e pediu pra ver as pedrinhas que tiraram da minha vesícula. Trouxe o vidrinho cheio e ela entrou em órbita: "como assim? uau!!! parece pimenta-do-reino!"
Não me ocorreu nenhum trocadilho decente. Aceito sugestões.
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Estou ouvindo Feist, Mika e Air. Estarei moderna?
* tupperware, em português
sem café
Outro dia eu escrevia que tomar café era o meu jeito de ver o mundo, de parar e sentir, de prestar atenção.
Imagine(m) o quão desasada me encontro, impossibilitada de tomar café.
Hoje estava andando à toa pelo bairro e entrei numa portinha, pedi um suco de abacaxi. Era o jeito. Longe de ser a mesma coisa - um café pede mais tempo de absorção, o tempo de soprá-lo, de bebê-lo devagar e sorver o amargo e perceber o fundo, ou retrogosto (se vem doce, se é ácido, etc). Enquanto isto alguém diz alguma coisa, você ouve um comentário divertido, vê um cachorro diferente passando na rua e um dono engraçado vindo atrás. Às vezes, enquanto o café esfria, eu abro o meu caderno e anoto alguma coisa que depois vou tentar desenvolver. O suco de abacaxi tem seu valor, mas a função é outra: refrescar, matar uma sede, ele não ajuda a contemplação.
E chá? Ora, chá. Chá é a melhor coisa para ajudar a olhar, mas ninguém mais faz chá em portinhas e balcões. Servem um aferventado de saquinho, uma tristeza com gosto de papel cozido que só dá vontade de escrever coisa triste.
Outro dia, então, acompanhei meu amigo Michi à confeitaria aqui em frente. Pedimos dois cafés, sentamos para conversar. Conversamos, demos risada, ele comeu um bolo e eu bebi os dois copinhos de água com gás. O café voltou intacto e ninguém se deu conta. Talvez seja o jeito. Por ora.
sexta-feira, 18 de maio de 2007
never mind the pollocks
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Lembro-me de ter ido ao Louvre, há quase vinte anos atrás (é sério), e irritar-me/apiedar-me dos japoneses que tiravam foto de tudo, quase sem examinar o objeto fotografado, tudo apressado, apreendendo o objeto, nunca compreendendo.
Lembro da Mona Lisa, atrás de um cordão de isolamento, cercada por uma redoma de vidro, emoldurada de dourado, parecendo-me um pequeno quadro escuro cercado de japoneses por todos os lados. O cartão-postal vendido na lojinha do Louvre revelava mais nuances que o próprio quadro.
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Hélas, viramos todos japoneses neste século. A câmera digital, celulares com câmera de alta definição, todos os avanços tecnológicos e, sobretudo, a sensação de que não há tempo suficiente e há coisas demais para ver... eis-nos hoje num museu, todos - absolutamente todos - de câmera em punho, passando rapidamente de tela em tela, de sala em sala, capturando (sem flashes) tudo o que nossas retinas registram. Os seguranças do museu não se importam mais com as câmeras. Só estão lá para garantir que ninguém toque nas obras.
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As Demoiselles d'Avignon conseguem se impor sobre os curiosos. Ocupam o lugar de honra de um salão inteiro dedicado a Picasso, o posto mais iluminado e acessível de uma sala impecável. O quadro é grande e a moldura não o oprime, é leve, mal se vê, as mulheres dissolvem-se na parede, elas respiram, é poderoso.
quarta-feira, 16 de maio de 2007
O mais escroto
Pois o Helinho estava em São Paulo, em temporada com seu espetaculo, e eu o convidei para ir me assistir num domingo. Como o teatro onde trabalho fica muito distante (só dá pra chegar de carro), Helinho precisou de um amigo para levá-lo. Como o amigo tinha uma namorada, Helinho entregou a ele o par de ingressos que eu lhe dera e resolveu pagar a própria entrada.
A caminho do teatro, Neusa, a namorada do amigo, dirigia. Chico, o amigo, ia no banco do passageiro e Helinho ia atrás. Na altura da Marginal, a situação foi ficando tensa. As pontes e as entradas surgiam do nada e qualquer desvio de rota era irreparável. Neusa olhava as placas com apreensão:
- "Para Interlagos, pista 4"... qual é a pista quatro?
Chico, num tom condescendente, apontou as pistas à frente:
- Um, dois, três, quatro.
- Porra, Chico - Neusa resmungou - Como você é escroto.
- Fala assim, não - Chico deu um peteleco no braço da namorada. Ela olhou para o lado para reclamar e perdeu a entrada da pista.
- Puta que pariu, Chico!
- Ah, não vem botar a culpa em mim, que você quis vir dirigindo.
- Caralho, Chico. Você é o cara mais escroto que eu conheço.
Enquanto brigavam e o carro adejava na Marginal Pinheiros, Helinho pensava em todas as brigas sérias a que tinha sobrevivido, e na ironia que seria morrer numa briga de casal - alheia. Na crueldade de morrer sem ter visto seu primeiro musical. E pensava também na incrível conjunção astral que unira Neusa ao cara mais escroto que ela conhecia.
"Se fosse em Tupã", pensava Helinho, "ou Piraí, ou outra cidade com 300 moradores, já seria um grande azar. Mas em São Paulo, com 20 milhões de habitantes... Ela foi namorar logo o cara mais escroto? "
Era muito azar.
terça-feira, 15 de maio de 2007
Iêba! Conseguii!
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Um aparte ao primeiro/ultimo post desta página. Não é verdade que não descobri nada de novo a meu respeito com a crise gástrica que me levou ao hospital. Descobri - e isto é muito importante - que pimentão me faz muito mal. E que chocolate não me faz mal nenhum. Informação utilíssima.
A Luminária
Com a guia na boca
Contou que Liana estava passeando no parque com sua amiga Lica e um cachorro. O cachorro não era de nenhuma das duas, era um bichon frisée gigante, do pai da Lica.
Quando saíram do parque, aquele trânsito maluco que ninguém sabe pra onde ir, as duas foram cortando caminho pelos passeios. Liana começou a temer pela amiga, pequenina, segurando um cachorro maior que ela, que poderia investir pela autopista a qualquer susto.
- Será que não é melhor a gente dar a volta pelo viaduto? - Liana sugeriu.
- Meu deus, é na outra ponta do parque.
- Mas e se este cachorro desembesta?
- Liana - disse Lica - olha uma coisa:
Soltou a guia do cachorro, que parou imediatamente, catou a ponta da guia pela boca e ficou segurando, para a Lica guiá-lo de volta.
- Ensinadinho, ele, né? - Liana comentou. E, enquanto via a amiga retomar o controle do animal, sentiu um fundo amargo de couro na língua.
Naquela noite, pediu o divórcio.
Agora sem as pedras
Minha mãe me contou uma história, quando eu estava no hospital.
Contou que, quando foi ao Marrocos, encantara-se com as paredes das casas, decoradas com seixos, conchinhas, como se fizessem uma moldura para a cor. De volta a Curitiba, percebeu que a casa em frente à sua tinha uma parede semelhante, sempre esteve ali, mas só agora ela enxergava.
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Também contou a história da dona Nadyr, moradora de Vila das Peças, na ilha de Superagui - litoral norte do Paraná. Animada com a onda do turismo ecológico, Dona Nadyr reformou a propria casa para receber os turistas. Construiu um puxadinho nos fundos para si e ergueu, defronte à casa que beirava o mar, um muro altíssimo. Igual aos que havia visto na cidade.
Minha mãe chamou a D. Nadyr para conversar:
- Mas pra quê o muro? - perguntou
- Porque é mais chique.
- Mas assim você tapa a vista do mar.
- Pra que que este povo quer ver mar?
Minha mãe fez cara de "vai por mim". D. Nadyr derrubou o muro, contrariadíssima.
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A experiência no hospital não me trouxe nada de transcendente. Concluí ou reconcluí o pouco que já sabia. Que não tenho arrependimentos. Que faço exatamente o que gostaria de fazer. Que desejo continuar fazendo o que faço. Que eu faço sentido quando existe o outro para sentir. Que meus amigos são o meu jeito de ver (e viver) o mundo.
Que as pessoas amadas são as que têm o poder de transformar as horas difíceis em horas felizes.