segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

tempo tempo tempo

O ensinamento que o ano me deixa é o da urgência de estar presente. Todo o resto é consequência ou ilusão. Juro, não é papo budista, ainda que eu tenha entre meus bons amigos alguns seguidores da filosofia. O que afirmo é mais um reflexo de algumas fichas que caíram, em vários momentos deste ano. Estar presente, plenamente - o que é bem mais difícil do que parece, vamos combinar - é a única justificativa para trabalhar loucamente, juntar dinheiro, montar uma obra, discutir uma idéia, brigar com alguém, reconciliar-se, todas estas tarefas desgastantes que implicam em estar vivo e relacionando-se com o mundo. A fama, o futuro, o legado, o amor do próximo, são consequências. Ou ilusão, quando são a cenoura à frente do burro, a única motivação para o movimento.

Pensa o quê? Minha busca é estar presente. Eu, que passei meia vida olhando pra frente e correndo atrás, noites em claro pensando no que pode dar errado, longas discussões entre eu e migo sobre o que é certo, o que eu deveria ter feito, o que eu podia... Muito tempo esperando o tempo certo, muito tempo deixando para depois, quando for o tempo. Não é simples. Agora, por exemplo, reflito olhando para trás, que é o que sei fazer.

sábado, 29 de dezembro de 2007

tempo de chavões e despedidas

Na madrugada do dia 26, um amigo querido foi embora. Ele estava doente, no hospital, e não sobreviveu. Foi muito rápido. Nós - os amigos - fomos informados da situação quando ele já estava na UTI e em menos de duas semanas ele faleceu.


O Alex - é o nome do meu amigo: Alex Neves - gostava muito de trabalhar. Muito, muito. Trabalhou além das forças, ignorou os sinais de fraqueza do corpo, parou só porque foi internado e aí já não dava mais tempo, mas não dava pra saber. Ele era bailarino, coreógrafo, professor, tinha 39 anos.


Durante este ano ele foi meu professor de dança. Eu tinha comentado com ele que minha decisão de ano-novo (no caso, o ano que termina) era aprender a dançar decentemente. Ele espalmou minha mão na sua, disse "arrasou!" e desde então estabelecemos esta relação nova, de professor e aluna. Já éramos colegas e amigos há seis anos, estávamos na nossa terceira peça juntos. Como professor, ele era de uma competência ímpar. O que sempre me impressionava era o bom-humor e a disposição para tentar de outro jeito. E a vontade de estar ali, onde quer que ali fosse. A aula se estendia para além da hora e meia, aí ficávamos sem almoço porque o ensaio já era dali a uma hora e ele chegava no teatro feliz como se tivesse ido pra casa, tomado um banho e batido um prato de feijão com bife.


Estou triste, os amigos estão tristes, foi rápido, não deu tempo de ir ao hospital e falar "peraí". Está esquisito pensar que as coisas continuam sem ele, quando continuarem. Mas continuam, eu sei. Esta consciência só me faz pensar novamente neste trajeto, nesta viagem que fazemos, no tempo que passamos olhando para frente, para a cenoura sempre adiante, e no tempo que passamos olhando pra paisagem, em que prestamos atenção no vento, no calor ou na chuva, nos companheiros de estrada, nos detalhes do caminho.


Caminhar, tentar saber pra onde, olhar a paisagem, tentar fazer sentido.


Chavão abre porta grande, já dizia o Itamar Assumpção. Pois é.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

A luz da Venezuela

Então, agora o Hugo Chávez resolveu atrasar oficialmente os relógios da Venezuela em meia hora, para "socializar" a luz - o que quer que isto signifique.

Minha cabecinha é pequena demais para compreender os motivos que levam um governante a mudar A HORA de um país, que não sejam simplesmente o desejo de se assemelhar a Deus diante de seus governados.

Tenho medo, tenho mesmo.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

'stamos em pleno mar


De Nova York para São Paulo, duas noites em casa e depois descer para Santos, para uma gig num navio, por uma semaninha.


O navio era italiano: os oficiais falavam italiano e inglês e os garçons, faxineiros, camareiros e cozinheiros falavam malaio e/ou espanhol. De dia o navio ancorava em algum lugar legal e todo mundo pegava um barquinho e descia passear. Peguei praia todo dia - nem lembro qual foi a última vez que tinha ido à praia - bebi cerveja com os meninos e até passeei pelo Rio de Janeiro no último dia (fui num shopping lindinho no Leblon, chamado Rio Design, queria passar a tarde ali). À tardinha partimos do porto do Rio (na praça mauá) e eu fiquei vendo, do deck do navio, a cidade, o recorte da costa, as luzes das favelas, as montanhas, tudo muito lindo.

À noite - bem tarde, tipo umas 23:30h - era o nosso show. Eu agarrava o pedestal do microfone para manter o equilíbrio (o teatro ficava justamente na proa do navio, onde o balanço é mais sentido) e tudo bem.

Me diverti muito, no final das contas. Mas é bom ir para casa.

No snow for you

Nevou niqui eu voltei. Ainda não foi desta vez. Terei que voltar.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

gone

gregório gruber (clique na imagem para ampliar)


E eu... fui!
Chegou a época da minha peregrinação anual. Fico duas semanas out. Ou in, aí depende do ponto de vista.


Meus posts de viagem serão publicados no http://annatrip.zip.net/


Beijos!

Allan Sieber strikes again

(clique nas imagens para ampliá-las)











quarta-feira, 14 de novembro de 2007

japanese english


The musical piece delivering is a certain three pieces of long pieces from one piece for 74 minutes. And one piece to be left is the NG version.


- descrição da obra de Katsushiko Watanabe, em seu site em inglês no My Space.

Niemeyer por Allan Sieber

terça-feira, 13 de novembro de 2007

família real

Hospedaram-se em nossa casa, esta semana, nossa amiga Lola Brea Moreno de Cisneros e seu marido, Sergio. Com um nome destes, quem é que troca de sobrenome?

Os dois são de Zaragoza e vivem em Málaga. Vieram nos visitar e andar por São Paulo para cima e para baixo, feito condenados. Faz duas noites que sonho em espanhol, por sinal. Muy pijo, muy guai.

sábado, 10 de novembro de 2007

Se um puxador de samba enredo cantasse A Banda...

OU: De como a retórica nem sempre ajuda a poética

Estava à toa na vida
O meu amor - fez o quê?
Me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando - o quê?
Coisas de amor
(...)
A moça triste que vivia calada, fez o quê? sorriu
A rosa triste que vivia fechada, fez o quê? se abriu
E a meninada toda, fez o quê? Se assanhou
Para ver o quê?

Para ver a banda passar
Cantando coisas de amor
(...)
O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou, o quê?
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou – onde? - na janela
Pensando o quê?
Que a banda tocava pra ela
(...)
Mas para meu desencanto
O que era doce – o que aconteceu? - acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois do quê? Depois que a banda passou
E cada qual, aonde? No seu canto
Em cada canto – o quê? Uma dor
Depois da banda passar
Cantando - o quê? Coisas de amor
Depois do quê?
Depois da banda passar
Cantando - o quê? Coisas de amor...

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

O Amor, o Amor... versão 2007



Patrick Moberg viu uma garota no metrô em NY. Apaixonou-se, mas não teve tempo de falar com ela.

Então ele criou um site: http://www.nygirlofmydreams.com/ onde ele a descrevia e pedia que os visitantes dessem informações sobre a misteriosa menina dos seus sonhos.


E não é que ele a encontrou?





E pediu pra ninguém mais se meter, que muito obrigado, mas que, de agora em diante, a história era só com eles.

Bonitinho, no mínimo.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

saber olhar

A:


B:

C:


D:




E:







Relacione, por favor, na ordem correta:

( ) Foca
( ) Leão-marinho
( ) Morsa
( ) Lontra
( ) Elefante-marinho (não estou de sacanagem)
Respostas no próximo post. Se houver interesse, é claro.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Visita ao Zoológico

Otávio (6 anos) e Tio Paulinho (idade não revelada) passeiam animadamente pelas alamedas do zoológico, numa bela tarde de sábado. Otávio nota um animal lustroso, preto e bigodudo nadando numa grande piscina.

Otávio : E este aqui, tio?
Tio Paulinho:Este aí... é uma foca.
Otávio (chamando): Foca! Foooocaaa!
Monitor (trazendo um grupo de visitantes): E este aqui é o Leão Marinho.
Otávio: É a Foca.
Monitor: Não. Este é o Leão Marinho.
Otávio: É UMA FOCA! FOOOOOCAAAA!!! FOOOOCAAA!!!
O monitor desiste e prossegue a visita com o grupo.

Otávio (para o tio Paulinho): Cara burro, né, tio?

a vida como ela é

- Mãe, vai ficar em casa o dia inteiro?
- Ahn.
- Quer ir passear no parque?
- O que que tem no parque..?
- Uai, tem grama, água, sol.
- Ufff... Pra que que eu quero ver barro?
- Quer ir ao shopping, então?
- Shopping..? Sem dinheiro, que graça.
- Não tem nenhum lugar que a senhora queira conhecer aqui em São Paulo?
- ...
- Hein, mãe? Eu levo a senhora.
- O crematório... fica muito longe?

quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Persepolis

Persepolis é a história da iraniana Marjane Satrapi. Ela cresceu no Irã durante a Revolução Islâmica, exilou-se em Viena na adolescencia, durante a guerra Irã-Iraque. Voltou ao seu país, para encontrá-lo ainda mais intolerante e irrespirável, até partir definitivamente para a França, onde estudou Artes Gráficas e, mais tarde, escreveu/desenhou sua obra-prima autobiográfica.





A graphic novel Persepolis foi comparada pela crítica a Maus, de Art Spiegel - muito apropriadamente, aliás: Marjane conta que foi depois de ler esta última que teve a iluminação de contar a própria história em quadrinhos.



Ainda não li Persepolis. Mas estou profundamente emocionada com o filme - Persepolis (2007) - que acabei de assistir. Ao que tudo indica, para variar, o livro vai mais fundo nos detalhes cotidianos do Irã dos anos 70 e nas transformações dos hábitos da população. O filme, no entanto, é belíssimo e muito comovente. O foco é a família de Marjane - um núcleo de pessoas esclarecidas, cultas, descendentes da antiga família real (anterior ao Xá) e com simpatias esquerdistas - que se opõem ao regime do Xá, torcem pela república popular e vêem-se, finalmente, prisioneiros da tirania islâmica instaurada pelo próprio desejo popular. Aha.


Dentro deste panorama dramático, há o pequeno drama de Marjane, deslocada em toda a parte, exilada na Áustria, exilada em seu próprio país, privada de seus valores verdadeiros. O filme fala de valores reais, dos que dão dimensão e identidade, dos valores que fazem sentido na vida.




P.S.: Persepolis, o filme, foi dirigido pela própria Marjane Satrapi e por Vincent Parronaud. Ah, é um filme de desenho animado em 2D, P&B, tudo de bom.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Across the Universe



Um dos mais belos filmes já feitos. Afirmo isto sem medo. Diante de um trabalho como este, o mínimo que eu posso fazer é ser destemperada.

Across the Universe é o terceiro filme da Julie Taymor (que realizou Titus (1999) e Frida (2002), além da legendária montagem d' O Rei Leão, na Broadway). O ponto de partida para a história são as canções dos Beatles. Personagens como Jude, Prudence, Lucy, Sadie, vivem os anos 60 e a cultura hippie, o movimento pacifista, os conflitos sociais, a guerra do Vietnã e a luta pelos direitos civis nos Estados Unidos.

Claro, o paralelo histórico com a guerra no Iraque é incontornável, é um dos motivos pelos quais o filme é tão preciso e necessário hoje. Ao mesmo tempo, este é um filme atemporal, como são as músicas dos Beatles. As músicas soam novas, revolucionárias, perfeitas, fresquíssimas. As imagens são encantadoras.

A ousadia em contextualizar as canções é imensa e, ao mesmo tempo, esta é uma opção generosa de Julie Taymor, ao expor radicalmente sua visão e compartilhá-la conosco. Quando ela oferece uma visão tão nova, ela só está dizendo que isto é possível - muitas visões, muitas versões, muitas canções são possíveis.


Passou na Mostra. Se Deus quiser, faz muito sucesso nos Estados Unidos e volta ao circuito comercial (no Brasil) no ano que vem.

Mais TIM Festival

Não fui ver a Björk. É a primeira coisa que preciso esclarecer, sempre que falo que fui ao TIM Festival. Sabe, ainda tenho esta pretensão, ilusão, desvario, sei lá, de pagar um preço razoável e assistir um show da Björk sentada, nem que seja para levantar para dançar, mas como parte opcional do show (em SP, o ingresso convencional para o show da Björk custava 200 reais. Não precisei pensar muito para ficar com preguiça).

Então tá, dito isto, fui ontem no auditório do Ibirapuera, ver a edição de jazz do TIM Festival. Abriu com o noneto do Joe Lovano, que fez um puta show legal, com uma pegada muito forte, todo mundo se divertindo. Depois veio o Joey de Francesco (organista) com o Bobby Hutcherson (vibrafonista), acompanhados por uma guitarra e uma bateria. Foi um show lindo, muito doce - ainda que com dois longos solos de bateria num show que durou 45 minutos no máximo!

Aí chegou o Cecil Taylor. Foi engraçado. Ele prendeu um pandeiro dentro do piano e ficava batendo nas notas graves para a platinela soar enquanto ele tocava. Divertido. Só que já iam uns vinte minutos e a piada continuava a mesma. Quando ele levantou, tirou a platinela de dentro do piano e continuou fazendo escala pra cima e pra baixo, eu desci tomar um café.

Acabei a noite no karaokê da Liberdade, onde ia encontrar uns amigos. Lá, sim, a transgressão musical é para valer.

Mais TIM

domingo, 28 de outubro de 2007

E agora... O incrivelmente parcial boletim do Tim Festival!

O show da Kátia B. foi bem chato. Ouvi quatro músicas e fui tomar café no lounge.

O show da Cibelle foi divertidíssimo. Di-ver-ti-dís-si-mo.

A Cat Power é muito legal, tem uma voz linda e é muito bacana de assistir. Mas depois do décimo-segundo blues eu peguei um táxi e voltei pra casa. Até que eu fiquei bastante...

Hoje, se tudo correr bem, vou ver o Joe Lovano.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

sensacional boletim etc etc etc

Déficit
estréia de Gael Garcia Bernal na direção. México, 2007.

Vamos, vamos. Faça um esforço. A tentação é grande. Mas é quase como chutar um cachorro caído. Vá. Resista ao impulso de usar o nome do filme para falar na fragilidade do roteiro. Resista ao trocadilho com a falta de direção e com a fraqueza das imagens. Ora, vamos, a intenção era boa e o Gael é um fofo, e este é o seu primeiro esforço na realização cinematográfica (ele produziu o filme, além de dirigí-lo).

Olhe pelo lado bom: o filme é bem-intencionado, quer retratar ... arram... o quê, mesmo? ah, sim, a juventude estragadinha, as diferenças sociais no méxico, a alienação, as drogas, zzzzz... Não, olhe, olhe. O filme tem outro grande mérito: não dura nem 90 minutos. Quando você está pensando que poderia ter ficado tomando café no lounge da Mostra, ele acaba. Não é tão ruim assim, é?

E o Gael é um ótimo ator. Veja por este lado. Ele vai se convencer de que deve continuar atuando e que um roteiro auto-indulgente e preguiçoso dificilmente sai do papel como algo bom, a menos que o diretor seja incrivelmente esperto e bom com as imagens. Ou seja. Viva o ator Gael.

imperdível boletim totalmente parcial sobre a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, parte tres



O Amor nos Tempos do Cólera, de Mike Newell (Inglaterra, 2007)
tradução desastrada do romance de Gabriel Garcia Márquez para o cinema.


A escolha do elenco é exemplar (do que imaginam os produtores e o diretor e o roteirista - ingleses - a respeito da cultura latina). Javier Bardem (espanhol), Giovanna Mezzogiorno (italiana), Fernanda Montenegro (brasileira), Benjamin Bratt e John Leguizamo (porto-riquenhos), Catalina Sandino-Moreno (colombiana): todos latinos, certo?

Está tudo muito três tons acima, todo mundo grita, o sangue ferve, as mulheres rasgam a roupa e mostram os peitos a qualquer pretexto - febre, raiva, tristeza, paixão, alegria, you name it. John Leguizamo, que sempre é caricato, seja fazendo Spawn ou ER, parece um vilão egresso de Zorro. Só falta torcer a ponta do bigode enquanto dá uma risadinha como canto da boca. Pensando bem, acho que ele faz isto.


Os personagens são pobremente retratados, sem nenhum tipo de tentativa de verossimilhança ou de compreensão por parte dos atores. Ok, concessão para o Javier Bardem, que consegue dar uma dignidadezinha ao seu personagem.


Não é bom. Não é bom.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

cão sem mundo


O artista costa-riquenho Guillermo Habacuc Vargas participou de uma exposição na Nicarágua com uma instalação que consistia de um cachorro amarrado numa cordinha de nylon, presa à parede da galeria. Na parede oposta, escrita com ração, lia-se a frase Eres lo que lees. O cachorro, apanhado na rua, doente e subnutrido, morreu depois de um dia, sem comida, sem água e sem descanso, submetido à visitação pública.


Tentando entender: Habacuc, o autor/artista/cretino, afirma que “o importante para mim era a hipocrisia do povo: um animal torna-se o foco de atenção quando o ponho num lugar branco onde as pessoas vão ver arte, e não quando está na rua morto de fome. O cão está mais vivo do que nunca porque continua a dar que falar”.


(E o Rasklonikov matou a velhinha porque a julgava vil e inútil e o seu julgamento bastava. E porque sem piedade um homem vai mais longe...)

A situação, denunciada pelo El País e documentada em várias imagens, deu origem a uma petição online contra o seu autor que já reúne, perto de 100.000 assinaturas (eu assinei a n.91.762). A petição pede que o artista seja boicotado e "desindicado" para representar a Costa Rica nas próximas exposições internacionais.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Sensacional boletim incrivelmente parcial da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo - parte dois



(título em português: A Era da Inocência),

de Denys Arcand (Canadá, 2007)


Denys Arcand é um artista eloquënte, com inteligência narrativa, bom-gosto e precisão nas imagens, edição, luz, escolha de elenco. Mas a sua matéria-prima, o que o leva a usar estas ferramentas, é o texto e, mais profundamente, sua necessidade de compartilhar sua visão humana.


Novamente, como em seus filmes mais conhecidos (O Declínio do Império Americano e As Invasões Bárbaras), o cineasta se utiliza de um paralelo entre um momento histórico arquetípico, vamos dizer assim, e a sociedade atual. No caso, o período escolhido para a comparação é a Idade Média - a Idade das Trevas do título original - uma época marcada pela mistificação, pela intolerância e pela alienação.


Corta para a vida cotidiana de Jean-Marc, um sujeito culto, inteligente e, em sua juventude, promissor, que vive alienado de si mesmo, massacrado pela rotina do seu casamento, pela relação com as filhas, pelo trabalho como funcionário público. Sua válvula de escape são os delírios onde ele obtém reconhecimento, sucesso, sexo e, às vezes, simplesmente algum afeto.


A sociedade retratada por Arcand é igualmente delirante - e, infelizmente, muito familiar. A a intolerância desumaniza . A obsessão regulamentar por formulários, procedimentos, padrões politicamente corretos e mistificações new-age alienam. A palavra que o protagonista busca, ao final do filme, para resumir o momento em que vive é "desintegração".


Denys Arcand é um humanista (um "pós-socialista", vamos falar assim) profundamente ferido e desapontado com o rumo que tomou a sociedade ocidental. No entanto, sua crença nas relações humanas permeia o sabor amargo de seu filme. Não há vida na alienação. Se voltarmos a nos ouvir e nos enxergar, voltaremos a viver.

Boletim incrivelmente parcial da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, parte um:



The Jane Austen Book Club (O Clube de Leitura de Jane Austen):
filme independente norte-americano da linhagem de Tomates Verdes Fritos (feel-good-chick-flick)
Com um monte de atores que eu conheço da tevê a cabo (a pediatra do Grey's Anatomy, a patricinha do Lost, a amiga das Gilmore Girls, a mãe da mina do Six Feet Under, o irmão da patricinha do Lost, o cara do House and so on...), mais a Maria Bello e a Emily Blunt.

Um monte de mulheres mezzo-neuróticas, mezzo-descoladas resolvem se reunir para um grupo de leitura da obra de Jane Austen. A vida de cada uma delas tem relação com os romances que estão discutindo. Elas se transformam gradualmente, se aproximam e se entendem e se divertem! Os homens que orbitam a vida delas acabam revelando-se muito menos clichês do que se esperaria de um filme aparentemente feminista. É divertido. Na verdade, é muito legal.

E o melhor é que a sessão não tinha fila, porque Cinéfilo de Mostra só assiste comédia romântica americana se for por engano. Dava para escolher lugar no cinema!

Largada(s)



Depois de um tempo, largar fica menos complicado. Largar a mão dos pais ao atravessar a rua, largar a casa antiga, a família, largar a cidade natal, largar a cidade que não vingou e a que vingou - mas só por um tempo. Largar o projeto que não ia dar tão certo assim. Largar hábitos. Largar um trabalho.

Às vezes não há muita escolha neste largar. Ainda que o abandono implique numa perda, a partida irreversível é mais leve do que aquela que carrega consigo a dúvida: terei errado?

Largar é disponibilizar. Ter as mãos livres, novamente, criar espaço, desapegar. Largar é seguir em frente.

Não é fácil. Eu só disse que, depois de um tempo, é menos complicado.


Domingo passado, o espetáculo My Fair Lady encerrou sua temporada, depois de oito meses em cartaz. Me despedi dos colegas com quem dividi intimamente meu cotidiano - muitos ali, vindos de trabalhos anteriores, mais próximos e frequentes do que a maioria dos meus familiares. De hoje em diante, bifurcamos novamente nossos caminhos e seguimos em frente, acenando até a próxima curva.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Circular Interna

Assunto:Churrasco de Fim de Ano
Att: todos os funcionários

Queridos amigos e colegas!
Estamos chegando ao final de 2007! Como é de praxe, teremos uma festa de confraternização e o Sr. Geraldo ofereceu o sítio para um churrasco. Os colegas que foram à festa, em anos anteriores, vão lembrar que o local é realmente muito agradável e propício a um evento deste porte.

A Dona Aline, esposa do Sr. Geraldo, está muito satisfeita em receber novamente o pessoal da empresa. Ela só pede que não façam bagunça como da outra vez, que não joguem os restos da carne na piscina, que não escondam as latinhas de cerveja vazias entre as almofadas do sofá e que esperem para usar o banheiro um de cada vez. Para evitar aborrecimentos, ela pediu uma caução de 50 reais por pessoa, a ser entregue na porteira do sítio para o Seu Neto, e que será devolvida na saída, caso o convidado não tenha destruído nada. Ela concordou em abrir mão do processo de danos morais que movia contra a empresa desde 2001, contanto que o Dr. Nivaldo concorde em permanecer de bermuda durante toda a festa e que a empresa pague o acordo devido até a próxima sexta feira, anterior ao sábado do churrasco.

Para evitar que alguém deixe de ir, ou se perca, sugerimos uma caravana para sairmos juntos de São Paulo em direção ao sítio do Sr. Geraldo. Assim as caronas ficam organizadas e todos saem e chegam no mesmo horário. Atendendo a maioria dos pedidos, o horário da saída ficou às 7:00, para chegar logo e ir esquentando a grelha. Ainda que para alguns pareça cedo, é importante lembrar que a Dona Hortênsia pediu para voltar antes das cinco, por causa da artrite, e a Dona Mara, da Contabilidade, só pode ir se for para voltar antes da novela das 6, porque, como todos sabem, a filha dela está atuando e ela – a dona Mara - ainda não aprendeu a gravar no DVD.

O local da saída será o estacionamento do Bar Bicha, nos fundos da loja de móveis Cesco, em frente à praça Benedito Calixto, em Pinheiros. Para facilitar o encontro, pedimos que todos esperem fora dos carros, se não estiver chovendo. Ou ainda, podemos nos encontrar todos na própria praça, que é mais fácil de achar. Para os que não sabem chegar no estacionamento do Bar Bicha, haverá uma pré-caravana saindo às 6:30h do Centro Cultural, no Metrô Vergueiro, em direção à praça Benedito Calixto, em Pinheiros. Pedimos a todos para não haver atrasos e não questionar a organização da caravana, que foi cuidadosamente estudada pelo nosso departamento de logística. O Sr. Mathias, do Departamento de Logística, também avisa que oferecerá um desconto para os carros que ficarem no estacionamento do Bar Bicha, de propriedade do seu tio Jonas.

Este ano, a Dona Jussara não vai comprar a carne, pois alega que todo mundo só come lingüiça e coraçãozinho, reclama que não tem picanha e joga metade da alcatra fora assim que ela esfria. Ficou acertado, então, que cada um deve levar a carne que pretende comer. Quem levar frango não pode mudar de idéia, depois. O churrasqueiro será o Rafael (Mosquito), do setor de limpeza. O Sr.Giuca e o Sr. Leonardo farão a provisão do carvão e do álcool. O Sr.Giuca também ficou de buscar o Mosquito no Jardim Letícia, às cinco da manhã do sábado, mas este último já avisou que talvez ele venha direto do forró – e neste caso, não será preciso buscá-lo.

Finalmente, pedimos a compreensão de todos para o assunto da sobremesa. Uma vez que foi decidido que a sobremesa é opcional, solicitamos que aqueles que desejem trazê-la, que o façam de modo discreto e comam em local afastado. Não podemos esquecer do lamentável incidente do ano retrasado, quando o Sr. Miguel Jorge, hoje afastado dos nossos quadros, chamou a Dona Terezinha de “gorda esganada”, porque ela não ajudara a comprar o sorvete, argumentando que estava de dieta, e tinha comido tudo.

Contamos com a presença de todos. Estamos certos de que será um dia de grande alegria e festa! Sem mais, atenciosamente,

Joana Ribeiro
Comissão de Relações Públicas e Eventos

Anexo a esta circular, vai um mapa com as direções para o Sítio do Sr. Geraldo. Contamos com a ajuda do Dr. Roberto Mirto, do Jurídico, único que lembra exatamente onde é para pegar a faixa 4 da Dutra para a Fernão Dias e onde fica a alça para Mairiporã. Sugerimos a todos que fiquem com seus celulares ligados na estrada e evitem os trotes, pois o Sr. Elpídio teve sérios problemas familiares na última festa, quando foi parar em Belo Horizonte devido a uma indicação errônea.

sábado, 13 de outubro de 2007


Paulo Autran (1922-2007)

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

só pra entrar no assunto

Tropa de Elite, o filme, provoca a mesma discussão que o seriado da Fox, 24H: " Estamos em guerra, afinal?" E - respondida a primeira pergunta [afirmativamente] - Vale tudo numa guerra? As perdas civis - ou inocentes - são justificáveis? Que guerra é esta?

O filme marca um gol inquestionável quando co-responsabiliza a classe média pela manutenção do tráfico. Ainda que não seja nenhuma novidade, a história dos estudantes que mantém uma ONG na favela e fumam maconha (fornecida por traficantes) é exemplar. Comprometimento social e tática do avestruz realmente não coexistem de modo sustentável.

...

A direção de atores é primorosa. Caio Junqueira apresenta o seu melhor trabalho. Wagner Moura é assombroso.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Sensíveis

A primeira vez que vi uma porta com sensor de movimento, eu tinha seis anos. Minha mãe trabalhava no BADEP - uma sigla que hoje não decifro mais - e a entrada do prédio ostentava uma novíssima e intimidadora porta de vidro que abria sozinha à aproximação do visitante. Lembro que todas as vezes que ia com a minha mãe ao seu trabalho, ela tinha que passar comigo umas trinta vezes por aquela porta. E ela passava, conversava com a porta, tentava enganá-la, entrava no jogo talvez até mais do que eu. Divertidíssimo.

Nos Estados Unidos, já adulta, travei contato com as descargas sensorizadas. Descargas de banheiro. Assim que a água da privada atinge um certo nível, ela dispara. O que provoca alguns sustos - mesmo em quem já sabe que isto pode acontecer, mas que está ali sentadinho, pensando na vida.

Em alguns barzinhos e boates, aqui em São Paulo, mesmo, a luz do banheiro acende assim que você entra. Ótimo se você estiver bêbado. Mas se você se agacha muito e/ou cai, a luz volta a apagar, o que é péssimo, se você estiver bêbado. Uma vez eu estava nesta situação - no banheiro, bêbada e muito agachada - e a luz apagou. Gritei "ei!" e a luz acendeu, o que me fez deduzir,bebadamente, que talvez o sensor fosse sonoro. Fiquei assobiando dentro da casinha para manter a luz acesa. Mico, mico, mico.

Hoje, num café dos Jardins, conheci uma lixeira com sensor de movimento. É só chegar meio perto dela que a tampa abre. Pois fiquei argumentando com a tampa, tentando enganá-la e testando a sua rapidez em engolir bolinhas de papel. Lembrei de novo da porta do BADEP, da minha mãe e dos meus seis, sete anos de idade.

Dois cafés com conhaque deixam a gente muito sensível.

...

Treze anos depois da primeira crise, começo a considerar a perspectiva de ter enxaqueca para sempre. Não é uma boa perspectiva. Mas sinto um tipo de alívio na resignação.

...

Segunda feira fui ao Centro. Fazia um ano que eu não passeava de verdade no Centro. Fui clássica: Cracolândia (rua Mauá e arredores, que melhoraram muito, por sinal), Senador Queiroz, Mercado Municipal e Rua 25 de Março. Puta passeio legal. Comi um pastel no mercado, com um abacaxi de sobremesa.

Só dá para encarar a 25 com MUITO bom humor - o que era o caso, depois de um pastel seguido de abacaxi. A 25 é indescritível, pode ser exasperante e assustadora, mas é a coisa mais parecida com um caldeirão de gente que eu conheço. As dez músicas diferentes que tocam ao mesmo tempo no mesmo espaço de dez metros quadrados, os carros e as pessoas que ocupam o mesmo lugar na rua, os ambulantes que não só abordam, mas pegam, puxam, seduzem, riem, cantam e jogam coisas na sua direção. Fui massageada (sim! e por duas pessoas diferentes!) enquanto andava, negociei preço de coisas que não comprei. Por fim, nos últimos vinte metros, tive que me livrar do bom humor e sair empurrando as pessoas com os cotovelos, para conseguir chegar na porta do metrô São Bento.

Puta passeio legal. A gente se sente milionário na 25.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Dieta da Carochinha




Tomo café da manhã de princesinha.
Almoço feito rainha.
Janto como um ogro.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

O tempo não tem consideração


Santiago, o filme do João Moreira Salles, tem em seu personagem principal o fascinante Santiago Badariotti Merlo, mordomo da família Moreira Salles durante trinta anos. Mas é difícil dizer que o filme é sobre Santiago. Eu assisti um filme sobre a memória: a tentativa de um cineasta de recuperar um tempo e um personagem (ainda que à revelia do próprio, algumas vezes), assim como a maior riqueza do velho mordomo, que se assombra e congratula por ainda falar o idioma piemontês e por se lembrar de todas as óperas que ama.


Outros podem assistir um filme que retrata a incrível condição servil de um homem que não fez outra coisa na vida - profissionalmente, vamos ressaltar, já que a vida interior de Santiago é das mais ricas e diversas: escrevia poesia, dançava, conhecia música, tocava piano e castanholas, dedicou quase todo seu tempo livre a pesquisar e transcrever a história da nobreza no mundo. Dotado de uma cultura monumental, jamais questionou, no entanto, sua posição social, nem pretendeu ascender e pertencer à aristocracia que servia.


Ainda pode-se assistir Santiago como um brilhante exercício de roteiro, pois o diretor recriou este filme a partir de um material esquecido há quinze anos, entrevistas que fizera com o seu mordomo e que não resultaram no que ele pretendia, na época. Num reposicionamento de olhar, João Moreira Salles enxergou outro modo de apresentar sua história, colocando-se como personagem fundamental da narrativa, aquele que olha, aquele que (também) lembra. Ao final, quem é transformado pelo processo é o seu realizador. Santiago não é, neste sentido, o protagonista da história: ele - e a memória - são o agente transformador.


Já falei que gostei do filme?


sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Curtinha*.


- Ah, você faz música alternativa?
- Sim.
- De que tipo?
- Alternativa D.

*e grossinha...

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

it's about time! (ou: já não era sem tempo!)

O Grande Chefe, do Lars Von Trier, acaba sendo um filme muito interessante. Na real, é um filme muito incômodo de assistir, eu quase saí do cinema diversas vezes, entre incomodada e aborrecida.

Lars Von Trier já produziu marcos de crueldade, como Dançando no Escuro, Dogville, Europa, diz aí. Em "O Grande Chefe", no entanto, ele não escapa de ser cruel, mas a sua chave é o humor vindo do ridículo, do que a gente chama de "vergonha alheia". Então, como não poderia deixar de ser, é um filme incômodo.

Só que o roteiro é brilhante, excelente, ótimo. Os diálogos são excelentes. Qualquer bom diretor, com a mão leve, faria deste mesmíssimo roteiro, sem alterar qualquer linha, uma comédia estapafúrdia, daquelas que se vê várias vezes, rindo cada vez mais. Não é o caso. A opção do Von Trier é a de incomodar pelo riso nervoso, usando o tempo real (com uma edição sem truque nenhum, os cortes estalam na nossa cara) e a falta de graça e/ou carisma especial dos personagens como aliados.

O cara é um virtuose, sem dúvida, e já o provou em todos os seus filmes anteriores. Aliás, acho que o cinema do Von Trier é sempre um exercício virtuosístico da narrativa, depois vem a alma, se é que ele acredita nestas bobagens. Sabe lá como pensam estes nórdicos.

Saí do cinema um tanto aborrecida, como quase sempre saio dos filmes dele (mas continuo indo ver, pois é), pensando nas maravilhas que o Woody Allen faria com este mesmo roteiro.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Nós, os indignos e derrotados.

Renan no seu lugar
JANIO DE FREITAS - Folha de SP (hoje)

TODA INDIGNAÇÃO com a vitória dada a Renan Calheiros pode justificar-se como sentimento pessoal, mas a coerência com o país em que vivemos não está ao lado dessa reação. Está com os 40 votos favoráveis e as 6 abstenções não menos favoráveis à permanência do acusado(...) como presidente do Congresso Nacional.

O Senado, contra apenas 35 dos seus 81 integrantes, decidiu que Renan Calheiros deve continuar com seu mandato e seu alto posto institucional (...) .Não é preciso ir mais longe. (...)

Incoerente com o estado do país é a projeção do fervor cívico e de esperanças sobre decisões dos habitantes do pântano a respeito de si mesmos.

O partido do governo [foi] o fator decisivo para a permanência de Renan Calheiros, insisto, não só na presidência do Senado, mas como presidente do Congresso Nacional. (...) Os 40 votos contra a cassação e as 6 abstenções de igual propósito e efeito foram, não há dúvida, conscientes como atos pessoais e coerentes como atos políticos: Renan Calheiros é o homem certo no lugar certo.





Ah! Está na Folha On Line, agora: 43 deputados afirmam que votaram contra a permanencia de Renan na presidência do Congresso. Ué. Tem voto sobrando. Puxa vida, será que alguém está mentindo?

quarta-feira, 12 de setembro de 2007



Não fique confuso
muso de alguma obra-prima
pode ser tudo amor
à rima

Alice Ruiz

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

E o prêmio de Melhor Trocadilho da Semana vai para*...

...O Conde Anton Wolfgang von Faber-Castell, presidente, dono, herdeiro, etc, do império dos lápis Faber-Castell, em entrevista à revista VEJA:

"O lápis tem seu papel!"


(hein? hein?)



* Na verdade, o trocadilho - involuntário - é de responsabilidade do tradutor da entrevista, uma vez que o Conde disse isto em alemão (ou inglês, na melhor das hipóteses). Mas vai falar que não ficou bom?

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

dica para aliens e viajantes espaciais


A Terra está num de seus melhores momentos para a observação de fenômenos naturais de ordem catastrófica! O privilegiado visitante, por estes dias, poderá observar a ocorrência de tufões, terremotos, tsunamis* e até o famoso vulcão Etna em erupção!


Não recomendamos, no entanto, a permanência em solo, sendo aconselhável uma distância mínima da ação das forças naturais, até para contemplar melhor o conjunto.


* a programação é fornecida pelo boletim sísmico-metereológico; não nos responsabilizamos por alterações climáticas.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

bem-casados

Sábado para domingo. Quase três da manhã. Assisto - pela segunda ou terceira vez - a sexta temporada de Sex and the City no dvd, brigando com o sono, feito criança manhosa que reluta em ir pra cama. Modelo pijamão, óculos e meia furada no dedinho.

Ruído de chave na porta da frente. Marcel vem entrando de smoking, carregando a guitarra e o amplificador. Até aí, nada de assustador, a não ser as vozes que vêm atrás - eu disse vozes, no plural. O eco anasalado denuncia o idioma gringo. Marcel dá um sorriso amarelo e diz:

- Babe, tá todo mundo aqui.

E antes que eu consiga dizer "motherfucking cow", entram cinco pessoas de black tie na minha casa. Três caras e duas minas. Cogito brevemente a hipótese de vestir uma roupa, pentear o cabelo, sei lá, colocar as lentes de contato. Acabo deixando pra lá, afinal, eles devem estar loucos o suficiente para não se incomodar com uma mina de pijama no meio da festa deles.

Um dos caras, Tufus, um negão magrinho, parecido com o Eric Bené, de dread locks e tudo, abre o piano e começa a tocar animadamente. Chris, o baterista, outro negão, mais alto e mais estiloso (smoking, chapéu e lenço de bolinha na cabeça), sorri: "puxa, desculpe a invasão", ao mesmo tempo que batuca na tampa do piano. A Gwen, uma negra magra de 1,90, vestido vermelho e cabelos compridos, que dá até pra chamar de "velha conhecida" (já nos esbarramos várias vezes em Boston e aqui) está encantada com os gatos e fala sem parar no quanto sente falta do seu próprio gato, que deixou na casa da mãe para vir ao Brasil. Me abraça, alisa meu braço e diz "Ai, você está usando algodão, que inveja!" Ally, a outra mina, é bem novinha, tipo uns 20 anos. Tem o cabelo tricolor(loiro, branco e vermelho), pele muito branca, é rolicinha e usa um vestido verde-água. Não podia pensar em nada mais americano. Me abraça horrores (entorta meus óculos) e me chama de "my fellow berkleean". Nunca nos vimos antes. Ela olha os quadros da sala e adora todos. Conto que são do meu irmão e ela adora mais ainda. Parece que tenho três rádios ligados no volume máximo. Ou quatro, se contar o Marcel, que também está excitadíssimo e não pára de andar de um lado pro outro na sala, sem saber exatamente o que fazer com tanta gente tão animada, nem como me explicar 1) o que todo mundo veio fazer ali; 2) como ele pode ter esquecido de me trazer os bem-casados da festa onde tocavam, antes.

Jotinha, o outro brasileiro da banda, abre o case do contrabaixo e tira uns docinhos:

- Tó, pra você - me entrega dois embrulhinhos em cambraia azul e fita de veludo. Sorri pro Marcel, "Limpei tua barra", e explica - Minha mulher não deixa nem eu entrar em casa se esquecer os bem-casados, então eu peguei um monte.

- Alguém quer um café? - pergunto. Ninguém quer café e eu não sou louca de oferecer vinho ou vodca - Um suco?

Perto de quatro e meia da manhã estão todos com fome e o Marcel decide levá-los ao Joakin's. Ouço, de dentro de casa, a longa discussão sobre quem deve entrar primeiro no carro, até que eles partem. Agora vou dormir. Domingo vou pro trabalho às 13h.

Sonho que estou passeando de pijama no Shopping Morumbi.

ouvindo sem parar

O novo disco da Roberta Sá - "Que Belo Estranho Dia Pra Se Ter Alegria".
Lindo, fresco, feliz. Uma beleza. Que bom.

domingo, 19 de agosto de 2007


- Descobri que rir me dá dor de cabeça.
- Sério?
- Pois, menina, é batata: eu bebo uns três uísques, começo a dar risada e - pronto! – fico com dor de cabeça.



- Gente, tô vendendo Natura.
- Ai que maravilha! Tô precisando de um monte de coisas.
- Pega a revista, anota a encomenda e paga no final do mês. A única coisa que eu peço é que o pagamento seja em espécime.
- Pode ser mamíferos? Eu tenho três sobrando, lá em casa.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

o ócio criativo

Então fiquei a tarde inteira vendo dvd, bebendo vinho e comendo crunch. Aí, lá pelas seis da tarde, fui pro piano e simplesmente compus uma canção inteirinha, novinha, deliciosa.

Aí o Marcel chegou às onze horas do treino e eu nem deixei ele trocar de roupa. Direto pro (assim chamado) estúdio, gravar guitarra, baixo, voz, equalizar, mixar, pronto. Duas da manhã e temos uma música recém-nascida pra nutrir.

Amanhã vou botar teclado. Ehe.
Anna tendo idéias mirabolantes: mais uma do Guile, o Ganso

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

são paulo não pode parar

Acho que disseram isto bem antes de eu nascer. É uma frase repetida com o peso e a conformação de uma verdade. Provoca diversas brincadeiras e paráfrases - a Regina Casé, por exemplo, disse que "São Paulo não pode parar porque não tem estacionamento" (ahahaha) - mas nenhum tipo de indignação, nenhuma revolta diante desta inquietude urbana (?!) que não deixa um cantinho sossegado.

Pois estou querendo que pare. Só um pouco. Só em alguns lugares, um de cada vez. Mas pare um pouquinho, respire. Não aguento mais prédio brotando onde havia um prédio menor, que foi construído no terreno daquela casa que foi demolida pra virar estacionamento, buraco onde havia rua que foi interditada pra passar o metrô novo, calçada de concreto onde havia calçada de pedrinha, asfalto em cima de asfalto e, para tudo acontecer, desvios de trânsito, britadeiras, tratores nas ruas, bate-estacas. Dá pra ficar só um pouquinho, só um pouquinho, dois minutos, conta até dez... só um pouquinho parado?

E a tudo isto, os ipês florescem completamente amarelos.

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

George, o cara.

A primeira vez que ouvi falar nele, foi no filme “Quando Éramos Reis” (When We Were Kings, 1996), que narrava a inacreditável luta entre Foreman e Ali no Congo/Zaire. Depois, muito entusiasmada, li o livro do Norman Mailer, “A Luta”, sobre o mesmo tema, e fiquei conhecendo mais este sujeito intrigante.

George Foreman tem uma vida inacreditável, ou vidas. Os gatos têm inveja dele. Pois senão, vejamos: de marginal de rua, virou campeão olímpico de boxe, depois campeão mundial com 32 vitórias consecutivas, até 1973 - todas por nocaute.

Em 74, ocorreu a lendária Luta na Selva (ou Rumble in the Jungle, que soa incrivelmente melhor), no Congo/Zaire, contra o desafiante Muhammed Ali – que tinha perdido o título e sido preso por se recusar a lutar no Vietnã, mas esta é outra história. George Foreman não havia perdido uma luta sequer e era mais pesado e monstruosamente forte. Ali dançou em volta dele durante oito rounds e, quando Foreman se cansou, aplicou-lhe uma seqüência rápida de golpes na cabeça, conseguindo o nocaute.

Em 77, Foreman recebeu um chamado, logo após uma luta. Ele ouviu a voz de Deus, pedindo que mudasse de vida. Parou de lutar, dedicou-se à religião e foi ordenado ministro de uma igreja no Texas. Dez anos depois, já com 38 anos, voltou aos ringues e, de pouco em pouco, foi ganhando lutas até desafiar o campeão Evander Hollyfield, em 1991, e, finalmente, recuperar o título mundial em 1994, aos 45 anos.

2007: preparo o meu jantar num George Foreman - que ganhei de presente depois de uma campanha maciça do tipo “não esqueça do meu George Foreman”, ao longo de seis meses. Grelhei duas fatias de berinjela e três shitakes junto com um bife de fígado suculento. O grill é uma das coisas mais perfeitas que temos em casa. Não deixo de pensar no quanto o George Foreman é um sujeito bacana, enquanto saboreio minha comida.

O próprio George (notem a intimidade) concorda que é mais conhecido pelo grill que licencia do que pela sua inacreditável trajetória. E ele não se importa nem um pouco. Tem 58 anos e, provavelmente, mais umas cinco vidas de sobra.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

um bom dia

O dia está lindo. Frio, sol, céu azulíssimo de São Paulo. Não há como não se admirar.
Ainda estou feliz. Tive um bom show na sexta, passei o sábado pela rua com a minha mãe, domingo fazendo muito pouco ao lado do Marcel. Estávamos tão preguiçosos que não conseguimos nem assistir um DVD: tomamos vinho, comemos chocolate, xingamos o filme e terminamos a noite vendo clipes no you tube.

Na sexta, a greve do metrô e o caos instalado na cidade atrapalharam um tanto. Amigos não chegaram no teatro. Chegou uma hora, parei de atender o telefone: sabia que era mais alguém dizendo que estava preso no trânsito e que não conseguiria chegar a tempo para o show. Isto foi chato.

O show, no entanto, foi cheio de bons presentes. Bons momentos musicais, amigos queridos no palco, amigos caros na platéia. Comentários que me deixaram especialmente feliz. Osmar Barutti reinventando minha música. Meu amigo Paulinho Sabbag, que veio de Curitiba, tocou (lindamente) duas músicas e voltou embora no ônibus da meia noite. Ainda me trouxe uma medalhinha de Lourdes de presente. Está no meu pescoço, desde então, lembrando-me quanto os amigos fazem diferença na nossa vida.

Paulinho ainda me deixou de presente um cd da Chiara Civello, que agora toca incessantemente, enquanto acordo, tomo café, abro e-mails e escrevo aqui.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

hoje, às 21h, tem super-show no SESC Pompéia!


Pronta para conquistar o palco! E amanhã, o mundo! AHAHAHAHA (gargalhada maligna)
( e esta é a minha versão super-descolada, super-esperta, super-antenada e super-pronta, feita pelo meu super-mano: Guile, o Ganso) Mais info: www.myspace.com/annatoledo

segunda-feira, 30 de julho de 2007

la mélancholie

Na esquina da minha rua tem uma banca que não vende jornais. Nem revistas. É uma banca daquelas de lata, com o jornaleiro dentro, mas há meses que ele não tem nada para vender e continua ali, o dia inteiro, com a banca aberta, ouvindo a rádio Cultura.

Ele ainda vende revistas velhas de tricô, cruzadinhas e alguns fascículos dessequenciados dos Mestres da Pintura. E a National Geographic de maio, que comprei mês passado só pra ter assunto.

Seu Geraldo, se não me engano. Passo por ali e digo "tudo bem?" e ele acena com a cabeça, sorri, depois volta para as suas palavras-cruzadas Coquetel, edição de fevereiro.

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Na agenda!

show dia 3 de agosto, sexta feira, 21h, no SESC Pompéia.
Mais info: www.myspace.com/annatoledo

Mind Games: nah!

Nove graus em São Paulo.
Decidida a lutar contra o óbvio e o redundante, proponho-me um jogo: não usar a expressão "que frio!" durante todo o dia, principalmente no trabalho.
Encapoto-me toda e parto em direção ao ponto de ônibus. 70 minutos depois, desço perto do viaduto João Dias e caminho os dez minutos que faltam até o Teatro Alfa. O porteiro me diz "Boa noite!", eu respondo: "Mas que frio, hein!?"

Assim não dá. Mas eu devia desconsiderar, afinal, fui pega desprevenida: vinha andando no vento gelado, ao cair da tarde, só passava isto pela minha cabeça. E se o jogo é meu, posso me dar outra chance. De agora em diante, atenção.

Entro no teatro pelo lobby (é mais quentinho), assino meu ponto e desço em direção ao camarim. Passo por todos os camareiros - "que frio, hein, Aninha?" - e apenas faço mímica de congelamento, enquanto beijo cada um. Mímica pode.

As outras atrizes vão chegando, uma a uma, comentando a temperatura lá fora. Reclamam do vento ao tirar a roupa e resmungam que o figurino poderia ser mais quentinho. Depois dos aquecimentos, subimos ao palco - quase todos comentando o vento encanado que sopra das docas. Resolvo fazer uns polichinelos - de vestido, peruca e chapéu florido, mesmo. "Frio, Aninha?", alguém pergunta. Bato os dentes, em resposta. Bater os dentes vale.

A peça começa e a luz dos refletores esquenta um pouco quem está no palco. Saio da primeira cena e vou para as docas, onde faço minha primeira troca de roupa. Tiro a saia, o casaco e o chapéu. Fico só de meia e collant, enquanto a camareira vai buscar a roupa da segunda cena. O vento encanado - aquele mesmo - bate em cheio nas minhas costas. Aí não vale.

- Puuuuutaqueopariuuuuquefriiiiio!!!

"Calma, Aninha. Frio é psicológico" - diz a Vera, minha camareira, rindo de dentro do seu casaco.

Assim não dá.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

...

Que tempos são estes
Em que é quase um delito falar de coisas inocentes
Pois implica silenciar tantos horrores?

Bertold Brecht

terça-feira, 17 de julho de 2007

D.O.M. (de iludir)

Couvert: alho assado, coalhada com ervas, manteiga com sal grosso, berigela e pimenta cambuci; Entrada: vieiras (2) no leite de coco com castanha e (1)chip de manga;
Prato Um: fois gras com sorbet de cambuci, arroz selvagem tostado, lascas de avelãs e consomé de bonito;
Prato Dois: filé(zinho) de pirarucu e camarão glaçado;
Prato Três: (uma colher de) purê de batata com trufa negra ralada*;
Prato Quatro: cupim com purê de batata e pequi, no consomê de cupim**;
Epílogo: (uma colher de) purê de batata com queijo minas e queijo gruyère.
Sobremesa: (uma colher de )sorvete de baunilha com calda de chocolate branco trufado e uma lasca de chocolate;
Café leggero (com acompanhamentos diversos);
Vinho chileno*** e água com gás.

...e pronto:a felicidade! Ou algo bem parecido.

*Obs.: foi o meu primeiro encontro com uma trufa. É interessante: tem gosto de terra, como outras raízes, mas com um fundo adocicado, sei lá. O garçom deixou eu cheirar. É uma bolota gigante, do tamanho de uma mão, preta por fora e cinzenta por dentro. Tem um cheiro de... trufa.

** by far, o melhor prato da noite. O cupim parecia um pudinzinho, nem tinha faca para comer, era só uma colher e um garfo. O purê de batata com pequi é um achado, fica laranja, da cor do pequi, e com o gosto do pequi, mas com consistência de purê.

*** foi o vinho mais barato da carta. Tinha um vinho, Chateau Petrus 78, que custava módicos 14.500 reais. Rárárá!!! Era pedir o vinho e entregar a chave do carro.


ilusão? realidade? quem se importa? a memória é o meu refúgio.

Angústias


São a coisa mais aborrecida do mundo. Não há problema aparente, o problema é dentro – daonde? O problema é um vazio ou um cheio, um nada que busca comida, bebida, televisão, trabalho, sexo, diversão ou outra argamassa para tapá-lo.

Angústia pode ser falta do que fazer. Mas às vezes, muita coisa a fazer também angustia.

Já tive uma grande angústia. Ou duas, ou três. Que sempre resultaram num ônibus, um avião, um destino novo para encontrar minha velha angústia esperando na plataforma.

terça-feira, 10 de julho de 2007

melhor é fazer a mala*

Grandes são os desertos, minh'alma,
e tudo é deserto..!

Acordei determinada a ir à academia
li num periódico que a massa muscular aumenta a queima calórica
e acelera o metabolismo

O despertador tocou no modo soneca: uma, duas, três vezes,
os gatos ajeitaram-se sobre meus joelhos,
quatro, cinco vezes. Levantei-me às onze horas e fui preparar minha primeira refeição
(li que é indispensável tomar o café da manhã
para o bom funcionamento do metabolismo).

Vesti a roupa de ginástica, para não mudar de idéia.

Tomei meu chá verde com leite de soja
(nem café, nem laticínio, de acordo com a dieta do tipo sanguíneo).
Liguei a televisão.
Revi o Grey's Anatomy, que vira ontem à noite.
Assisti o último capítulo da 2a. temporada de 6FeetUnder, no DVD
e os capítulos de Lost que um amigo emprestou.

Ainda estou com a roupa de ginástica.

Grandes são os desertos, minh'alma,
e tudo é deserto..!


* álvaro de campos

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Novas utilidades para os teasers da Sessão da Tarde

Agora que o gabarito-gerador de chamadas da Sessão da Tarde ficou um pouco desacreditado, poderia-se utilizá-lo para anunciar outros produtos culturais, como, sei lá, peças de teatro ou livros. A linguagem de forte apelo publicitário poderia, inclusive, ajudar a popularizar grandes clássicos da cultura universal. Se não, vejamos:

"Um cara muito louco, aprontando as maiores confusões!"
(sobre Hamlet, de Shakespeare)

"Uma família muito louca, aprontando todas num casamento da pesada!"
(álbum de Família, de Nelson Rodrigues)

"Estas caras muito doidos vaõ aprontar as maiores confusões!"
(Os irmãos karamázov, de Dostoiévski)

"Uma família da pesada, que vai deixar esta cidade muito louca de cabeça pra baixo!"
(Cem anos de Solidão, de Garcia Márquez)

"Um cara muito louco..."
(O Guardador de Rebanhos, de Alberto Caeiro/Fernando Pessoa)

"Um cara muito louco, aprontando as maiores confusões!"
(Novo Testamento, n'A Bíblia, vários autores)

Uma turma da pesada aprontando as maiores confusões!

Sensacional!

Êba! Veio alguém com mais talento e paciência, editou os teasers da Sessão da Tarde e postou um clipe no You Tube, deixando muito clara como é mole a vida dos redatores das chamadas dos filmes vespertinos. Ou como é chata.

Agora não adianta falar que eu já tinha pensado nisto.

Ao que interessa: o clipe aqui.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

hyatt e outras lâmpadas

Minha amiga Giana está doente há semanas. Não é sério, é uma gripe que não passa. Mas, como ela é cantora e vive de cantar quase todos os dias, virou um problemão. Faz duas semanas que eu canto no lugar dela, às quartas feiras, no Upstairs Lounge do Hotel Hyatt. Para mim é ótimo, o lugar é lindo e o trampo é leve: eu só preciso chegar, abrir minha pasta de standards e cantar - com o Michi, ainda por cima, que é um excelente violonista. Eu me divirto, ela se recupera, estamos todos felizes.

Os clientes do Upstairs são, mainly, egressos do mundo fashion. Não sei o porque, semana passada eu achei que era uma rebarba do Fashion Week. Mas hoje ainda via pessoas com jeito de modelos e pessoas com jeito de designers e até reconheci o dono da Osklen (que eu adoro, inclusive, mas nunca comprei nada lá porque é caro). Estes clientes, que ficam circulando pelo restaurante/bar, são ultracool e não perdem tempo aplaudindo as músicas. Às vezes eles cruzam acidentalmente o olhar com os músicos, normalmente quando estão procurando o banheiro.

Os estrangeiros costumam aplaudir sempre que tocamos Djavan e outras coisas mais ritmadas. Hoje, dois Jorge Benjor e um Gilberto Gil foram muito aplaudidos.

O gerente do hotel gosta que toquemos jazz e bossa nova.

Meu marido foi às duas noites que cantei e levou seus amigos do escritório. Eles ficam ali bebendo cerveja Erdinger e curtindo as músicas. Gostam especialmente dos blues e dos swings mais acelerados. É uma boa platéia. Sincera e interessada.
...




Fui beber na Vila Madalena, ontem à noite. Fazia tempo que não ia. É quase como viajar. Na mesa ao lado, cinco garotas de saia de florzinha.

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Realeza

Gregório chutou o balde: entrou no Emporio Armani e saiu com um terno de 6000 reais. Chegou no escritório, na segunda feira, com outros ventos. Ninguém precisava saber que assumira dez salgadas prestações (600 reais, sem juros, no cartão). Era um vencedor.

Wilmar chegou-se muito acanhadamente para o colega. Nem um mês tinha passado do dia em que Gregório fizera sua entrada triunfal pelo corredor e acomodara-se na baia com a realeza do terno novo. De gerente para gerente, o primeiro cumprimentou:
- Beleza, Greg?
Sem desviar os olhos do laptop, Gregório assentiu com a cabeça. Wilmar continuou:
- Meu, vim te pedir um favor de irmão.
- Manda.

A história era até simples. Wilmar seria padrinho de um casamento importante dali a uma semana, a cerimônia era num buffet no Morumbi e ele não tinha um terno à altura da festa. Tinha duas opções: ou pegava um empréstimo no banco para comprar uma roupa nova, ou...

- O meu Armani? - reagiu Gregório, quase violentamente.
- É só para o fim de semana, eu mando para a lavanderia, devolvo novo, nem vou beber na festa para não espirrar nada.
- Puta que o pariu, meu...
- Você quer, eu pago pelo aluguel.
- Não, não... - respirou fundo - Tudo bem. Eu te empresto. É só um terno, afinal. Mas cuida bem dele, cara.
- Claro, claro - Wilmar parecia remoçado de alívio.

Passou o final de semana, chegou a segunda feira e Gregório não encontrou o colega no escritório. Terça feira, final da tarde, perguntou de Wilmar para a garota do RH.

- Ah, o Wilmar, menino. Coisa fulminante. Nem deu tempo de avisar todo o pessoal do escritório. Você era amigo dele? O enterro é hoje à tarde, acho que você ainda pega o velório.

Como explicar que mal conhecia o falecido mas que ele lhe devia um terno caríssimo?

Sem saber o que estava fazendo, desabalou-se em meros 40min para o Cemitério da Consolação. Entrou na capela do velório ainda ensaiando o que diria para a família, quando enxergou o caixão, com Wilmar ali dentro, descansando na realeza de um Armani legítimo.

segunda-feira, 18 de junho de 2007


então...

Sabe o que o rato falou quando pisou no pé do outro?

- Desculpa, foi mouse, aí.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

por que preciso tomar café

Conversando no café do Felipe, com o próprio, bla, bla, bla e ele está falando dos filhos. Então ele pergunta:
- Você tem filhos?
- Não - respondo.
- Filhos...
Mexo o café com a colherzinha de plástico e deixo-o continuar.
- É uma paixão - ele diz - A maior de todas.
Faço que sim com a cabeça, como se soubesse ou entendesse. Felipe sorri e repete:
- A gente morre quando eles nascem.


Estas conversas nunca acontecem com suco de abacaxi.

terça-feira, 12 de junho de 2007

the best love songs ever

When I'm 64
(lennon/mc cartney)

When I get older losing my hair,
Many years from now.
Will you still be sending me a Valentine.
Birthday greetings bottle of wine.
If I'd been out till quarter to three.
Would you lock the door.
Will you still need me, will you still feed me,
When I'm sixty-four.

You'll be older too,
And if you say the word,
I could stay with you.

I could be handy, mending a fuse
When your lights ha ve gone.
You can knit a sweater by the fireside
Sunday morning go for a ride,
Doing the garden, digging the weeds,
Who could ask for more.
Will you still need me,
will you still feed me
When I'm sixty-four.

Every summer we can rent a cottage,
In the Isle of Wight, if it's not too dear
We shall scrimp and save
Grandchildren on your knee
Vera, Chuck & Dave

Send me a postcard, drop me a line,
Stating point of view.
Indicate precisely what you mean to say
Yours sincerely wasting away.
Give me your answer, fill in a form
Mine for evermore.
Will you still need me, will you still feed me
When I'm sixty-four.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente









Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.

Pablo Neruda

sábado, 9 de junho de 2007

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Twilight zone no Metrô Ana Rosa

O trem aproximou-se como se ainda tivesse mil anos para cumprir. Estancou na estação com um suspiro doloroso. Fosse um cachorro, seria a hora em que abriria as quatro patas e cairia de barriga no chão. Era um trem. Uivou, tossiu e parou com as portas fechadas.

Os passageiros parados na plataforma, já muito adiantados da linha de embarque amarela, viram-se obrigados a recuar e dissimular o ligeiro desequilíbrio que o impulso frustrado de embarcar provocava.

Um silêncio de dois ou três minutos, onde ninguém olhava para ninguém e todos olhavam para os lados, esperando uma explicação. De repente, o trem recomeçou a andar para trás, de onde viera. Os vagões completamente vazios. A cabine do condutor vazia. Em segundos, desapareceu.

No meu ipod, a música que acabara de tocar recomeçou. Olhei para o relógio da estação. O ponteiro se mexeu. Chegou outro trem, carregado de passageiros. A vida seguiu.

sexta-feira, 1 de junho de 2007

o death, where is thy sting?

Tevê a cabo, tevê paga:
No Multishow, um especial com o cantor e compositor Buchecha.

No GNT Fashion, um especial sobre a moda no casamento de Wanessa Camargo. Com direito a clipes da mina e fotos dos padrinhos. A Lilian Pacce entrevista a noiva e pede para ela definir seu estilo atual.

Yaun (bocejo).

terça-feira, 29 de maio de 2007

Beverly Hills, Iguatemi.

Estava eu, linda, esquentando minha sopa de inhame, quando o telefone tocou. Deixei a secretária atender, ouvi uma voz conhecida, fui correndo até o aparelho:
- Anna? É a Lelê.
Minha amiga Letícia estava na cidade para lançar o filme que tinha feito com o Rodrigo Santoro. Queria saber se eu queria ir à pré-estréia, aquela noite.
- Caramba. Tenho um compromisso.
- Ah, puxa.
- O Rodrigo Santoro vai? - perguntei.
- Vai, claro.
Droga.
...
Eu tinha um compromisso importante, marcado há um tempão, que já havia desmarcado antes por causa da internação. Não podia adiar novamente.
- Meu, não vai dar, mesmo.
- O que você vai fazer agora à tarde, então?
- Nada.
- Eu estou no Ceasar Park, na rua Olimpíadas. Vou ficar aqui a tarde inteira.
- ...
- É muito fora de mão? - ela perguntou.
- É um pouco - admiti, imaginando os 45 min sacudidos no Vila Gilda.
- Então vamos fazer o seguinte: o cabeleireiro vinha aqui no hotel, mas eu posso ir direto no salão, no Shopping Iguatemi, e a gente se encontra lá. Que tal?

Adorei. Primeiro, porque o lugar fica a vinte minutos da minha casa; segundo, porque este shopping é cheio de gente riquérrima e blasé, que finge não dar a mínima para as celebridades (uma vez fomos juntas à Galeria do Rock, no centro de SP, e eu quase morri de tédio, porque eram dois passos e cinco autógrafos - e não era eu que estava autografando!).

Foi o que rolou. Chegamos no shopping, pegamos o elevador e subimos até o 9o. andar, para o Studio W, o salão do Wanderley Nunes.

Uau. Posso afirmar que o visual é calculado para intimidar. É um andar inteiro aberto, sustentado por colunas de ferro esverdeadas em forma de W e meias-paredes de espelho por toda a parte, nunca fechando completamente os ambientes. Uma loucura. Telas de plasma passando clipes dos famosos produzidos pelo Wanderley Nunes (caso alguém desconhecesse o portfolio do rapaz...).

A recepção lembrava qualquer filme passado em Beverly Hills, quando a mocinha vai ganhar o banho de loja. Um longo balcão de aço, cheio de garotas escovadas, altas e magras, de terninho cinza, postadas atrás de seus respectivos computadores. Uau.

- A senhora marcou hora? - a primeira menina sorriu, descaradamente olhando pros meus sapatos (que eram ótimos, by the way).
- Ela está comigo - disse a Lê.
- Ah! - a garota ficou toda embananada - Desculpe, Letícia, não vi... Queiram entrar, deixem a bolsa aqui... Querem um cappuccino? Uma água?

Algumas trufas, chá verde, água e massagens depois, fomos conduzidas ao salão propriamente dito, onde me ofereceram uma manicure de cortesia!!! AHAHAHAHA. Divertido. Inclusive porque a Leticia não tinha marcado hora, também.

Depois de tanto mimo, eu me sentia absolutamente à altura de dar oi pro Rodrigo Santoro, mas tive que seguir o roteiro prévio e correr para o meu compromisso, às seis da tarde. Paciência. Eu já tivera meu "momento Pasárgada". Só posso torcer para a Lê vir mais vezes para cá.
...
À noite encontrei meu marido, em casa, e ele verificava as mensagens na máquina:
- A Letícia te ligou, você viu?
- Vi, saí com ela hoje à tarde - respondi.
- Ah, é? O que que ela queria?
- Convidar a gente pra ir na pré-estréia do filme.
- Aquele como Rodrigo Santoro? - Marcel quis saber.
- É.
- Ele ia estar lá?
- Ia.
- Putz! - suspirou - Por que você não me falou?













Lê e eu, em ângulo bração.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Second Life or No Life at All

Ainda não experimentei o Second Life. Sou, capricorniana, um tanto resistente a tanta novidade. O que não me impede de já ter uma opinião a respeito, claro. Me assusta um pouco este conceito "matrix" de estar conectado a outra vida, vivenciando (detesto esta palavra, desculpem) experiências através do cérebro, com o corpo servindo tão-somente de suporte energético. A plenitude é cada vez menos desejável: vivem-se (fortes?) emoções virtualmente, sem a participação dos sentidos reais, enquanto o corpo fenece e engorda, atrofiado ou, para ser menos dramática, acomodado numa poltrona, diante de um computador.

Ah, as sombras de platão, bla, bla, bla.



Uns bons vinte anos atrás, o Luiz Fernando Veríssimo publicou uma charge intitulada "O Pós-Modernismo", onde um sujeito filmava um pôr-do-sol deslumbrante e comentava, entusiasmado: "mal posso esperar para assistir isto no vídeo, lá em casa!"

Hoje fui assistir um espetáculo infantil, à tarde, numa sessão fechada para escolas (meu amigo Paulinho está no elenco e conseguiu me pôr para dentro - a peça, aliás, é lindinha!). Mas, enfim, o que me deixou assustada foi a quantidade de crianças que não conseguiam assistir a peça sem filmá-la no celular. Tinha um garoto bem na fila em frente à minha que baixava seus e-mails, jogava, filmava a peça e mostrava o filminho para os colegas, tudo durante o espetáculo.

Afora o desejo quase incontrolável de dar um peteleco no guri, sobreveio um tipo de tristeza, uma pena, porque este guri e todos os piás iguais a ele já não conseguem estar num lugar só e experimentar viver plenamente o momento. Os sentidos foram subjugados por uma ansiedade (burra, burríssima, sem propósito) de dar conta de várias coisas, de não "perder tempo".

Mas o que está acontecendo é isto: a gente está perdendo tempo. Perdemos o presente.


* ilustração: Gregório Gruber