quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Sensíveis

A primeira vez que vi uma porta com sensor de movimento, eu tinha seis anos. Minha mãe trabalhava no BADEP - uma sigla que hoje não decifro mais - e a entrada do prédio ostentava uma novíssima e intimidadora porta de vidro que abria sozinha à aproximação do visitante. Lembro que todas as vezes que ia com a minha mãe ao seu trabalho, ela tinha que passar comigo umas trinta vezes por aquela porta. E ela passava, conversava com a porta, tentava enganá-la, entrava no jogo talvez até mais do que eu. Divertidíssimo.

Nos Estados Unidos, já adulta, travei contato com as descargas sensorizadas. Descargas de banheiro. Assim que a água da privada atinge um certo nível, ela dispara. O que provoca alguns sustos - mesmo em quem já sabe que isto pode acontecer, mas que está ali sentadinho, pensando na vida.

Em alguns barzinhos e boates, aqui em São Paulo, mesmo, a luz do banheiro acende assim que você entra. Ótimo se você estiver bêbado. Mas se você se agacha muito e/ou cai, a luz volta a apagar, o que é péssimo, se você estiver bêbado. Uma vez eu estava nesta situação - no banheiro, bêbada e muito agachada - e a luz apagou. Gritei "ei!" e a luz acendeu, o que me fez deduzir,bebadamente, que talvez o sensor fosse sonoro. Fiquei assobiando dentro da casinha para manter a luz acesa. Mico, mico, mico.

Hoje, num café dos Jardins, conheci uma lixeira com sensor de movimento. É só chegar meio perto dela que a tampa abre. Pois fiquei argumentando com a tampa, tentando enganá-la e testando a sua rapidez em engolir bolinhas de papel. Lembrei de novo da porta do BADEP, da minha mãe e dos meus seis, sete anos de idade.

Dois cafés com conhaque deixam a gente muito sensível.

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Treze anos depois da primeira crise, começo a considerar a perspectiva de ter enxaqueca para sempre. Não é uma boa perspectiva. Mas sinto um tipo de alívio na resignação.

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Segunda feira fui ao Centro. Fazia um ano que eu não passeava de verdade no Centro. Fui clássica: Cracolândia (rua Mauá e arredores, que melhoraram muito, por sinal), Senador Queiroz, Mercado Municipal e Rua 25 de Março. Puta passeio legal. Comi um pastel no mercado, com um abacaxi de sobremesa.

Só dá para encarar a 25 com MUITO bom humor - o que era o caso, depois de um pastel seguido de abacaxi. A 25 é indescritível, pode ser exasperante e assustadora, mas é a coisa mais parecida com um caldeirão de gente que eu conheço. As dez músicas diferentes que tocam ao mesmo tempo no mesmo espaço de dez metros quadrados, os carros e as pessoas que ocupam o mesmo lugar na rua, os ambulantes que não só abordam, mas pegam, puxam, seduzem, riem, cantam e jogam coisas na sua direção. Fui massageada (sim! e por duas pessoas diferentes!) enquanto andava, negociei preço de coisas que não comprei. Por fim, nos últimos vinte metros, tive que me livrar do bom humor e sair empurrando as pessoas com os cotovelos, para conseguir chegar na porta do metrô São Bento.

Puta passeio legal. A gente se sente milionário na 25.

Um comentário:

thais cavalcanti disse...

nunca vi descarga sensorizada! uau! e também ainda nao fui apresentada a lixiera com sensor de movimento. hahahaha e to precisando muito fazer esse passeio da 25. falta paciência.